Lembro-me que falavam muito dela perto do mar. "Não era velha, nem moça. Só meio doidinha", contou-me o sorveteiro. "Ela chegava na praia e reclamava. O que foi, muié. Nada, nada, um pouco de areia nos olhos". Ela sempre tinha areia nos olhos, me garantiu.
"No lugar do coração, parecia que nadava um peixe vermelho", disse-me o pescador. Tentou fisgá-la? "Encostara tanto nos óleos do navio que o coração dela escorregava na mão da gente", lamentava com um riso de canto de boca.
A moça da tapioca encontrava com ela toda noite. "Só comia com manteiga", conta. "Pra não engordar, Delfina", imitava-a colocando as mãos na cintura. "Passava muita água de cheiro, mas no fundo, era um cheiro de enseada!".
"Aí eu peguei na mão dela, as linhas, juro, pareciam aquelas linhas fundas de concha", revelou-me a flanelinha. "Contei isso a ela. Ela riu. Falou que ia ficar com a mão bem fechada pra cair uma pérola". "A gente sentava aqui e tomava um refri, cedinho da noite", lembrou.
Contavam dela minguando a voz no fim. "Ela pediu que segurasse a rosa azul que botava no cabelo", disse-me o dono do bar. "Eram duas da madrugada e ela foi pular onda". Engoliu ar e continuou, "ninguém sabe se morreu afogada, se fugiu num barco". E o enfeite de cabelo? "Ficou pesando azul na minha mão, parecia o mar"
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4 comentários:
bonito
muito bacana!
ótimo, ana.
assim vai leve, do jeito que tem que ser.
lindo
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