quinta-feira, 13 de março de 2008

Sintaxe Pessoal

O engarrafamento ia espremendo. A voz de Mano Brown estranhamente não entrava na música e eu não sabia se ela entraria ou não. A letra se estendia: “Segunda: a Patrícia. Terça: a Marcela. Quarta: a Raíssa. Quinta: a Daniela. Sexta: A Elizângela. Sábado: a Rosângela. E Domingo? É matinê, dezesseis, o nome é Ângela”. De todas só a Raíssa me chamava a atenção. Não à toa, era o nome mais próximo da minha realidade. Olhei pelo retrovisor e mandei chupar prego o tarado do Fiat vermelho. Cara de gordo e usava chapéu estilo cowboy retardado. Ninguém que use adereços contra raios solares à noite consegue dirigir bem. É questão de sintaxe pessoal.

A voz ficou carregada de um sotaque paulista e nojento e eu dedei o botão que faz o painel do rádio soltar-se. Em casa, minha luz cortada do andar de cima fez bem ao meu corpo. A água fria descia minhas costas com cifose de escritório, apesar de a minha ereção ter sido desestimulada. Foda-se, pensei.

Em qualquer canal, minha televisão no mudo falava demais. O espelho do raque estava voltado pra mim e pude ver na janela meu vizinho dando a marcha-a-ré. O pé de maracujá avançava alguns tentáculos pela fiação que ainda não havia sido roubada por algum ambulante atrás de três reais o quilo de cobre. Minhas costas colavam-se defronte com o sofá. Isso me irritava. Ao lado do espelho três álbuns esperavam para ser ouvidos e resenhados. Dois eram de bandas de rock compostas por crianças de 7 anos. Era moda. Lançados pelo Márcio Garcia. Não os ouviria.

Carlinhos Brown, “Do meu pé a boca fala do Já-pão”. Dei nota 2 pelo título ridículo. Algumas músicas não precisavam ser ouvidas: “Pagodi-lá”, “ABEUVC. Merda total, pensei, desses artistas latinos adorados pelos latinoamericanos cansados de seus populares chicletes radiofônicos. Se crescesse ouvindo Julio Iglesias e tivesse que ouvir Juanes, certamente adoraria Carlinhos Brown. Vanguarda, espalharia. Claro. É óbvio.

Mas não. Cresci ouvindo Willian e Duda do Borel. Vanguarda pra mim é isso. Depois disso só o que me chama atenção é a barriga da Kelly Key.

8 comentários:

ana rita disse...

Chupar pregos, tentáculos de maracujá, dedar o botão e colar as costas no sofá

Umas imagens bacanas, primeiro parágrafo bem musicado. Ainda doem um pouco as frases longas, não sei se são as vistas ou é agonia mesmo.

O fim tinha tudo para ser clichê, mas ficou interessante, humor legal

Anônimo disse...

Yep I saw that. =///
But keep away all fortune of badness.
And your text make me confuse bout my little portuguese.

Anônimo disse...

Esses funkeiros sabem gravar cd's com músicas que não param de tocar no meu som.

Por falar nisso, te devo um cd.
Quando puder pega-lo, ou quiser que eu te intregue,me avisa?


beijos, La.
=*

Anônimo disse...

Você está literalmente brincando comigo. Não cobrarei nunca esse cd. =D Beijos, obrigado.

Anônimo disse...

sensacional caro mio.

"Chupar pregos, tentáculos de maracujá, dedar o botão e colar as costas no sofá

Umas imagens bacanas" (duas)

L. L. disse...

um dia ele vai ser um escritor, um desses bem fodas, e eu vou ter os livros dele na minha estante.

Anônimo disse...

Muito bom!

Morganna disse...

táquipariu, Yuri. O final ficou ótimo.

um dia ele vai ser um escritor, um desses bem fodas, e eu vou ter os livros dele na minha estante. [2]